O marco histórico da cultura blumenauense é
construído no começo da colonização da cidade com a criação da Sociedade Teatral
de Blumenau na rua das Palmeiras com a denominação de Sociedade Teatral Frohsinn.
A pedra fundamental do Teatro Carlos Gomes, localizado na Rua XV de Novembro, lançada
no dia 10 de dezembro de 1935 une a antiga Sociedade Teatral Frohsinn, com a
Sociedade Liederkrantz e atualmente denomina Sociedade Dramático Musical Carlos
Gomes.
Em 1939, a conclusão da primeira parte das obras
do novo espaço cultural da cidade com salão de festas, restaurante e a
inauguração do Teatro revela um incentivo importante de fomento da cultura na
cidade. Em 5 de dezembro de 1942, a conclusão da sala de espetáculos, coxias e
o palco giratório com 12 metros de diâmetro traz um novo conceito e inovação
que ainda hoje é prerrogativa de poucos teatros brasileiros. A construção do
Pequeno Auditório, escadarias, administração, hall principal, salas de apoio,
salas de ensaio para música e dança em 1968 finalizam a proposta da estrutura que
é palco de espetáculos e momentos memoráveis da cultura e história de Blumenau.
Intervenções nas décadas de 1980, 1990 e no começo dos anos 2000 criaram uma
conexão com um processo de restauro e reciclagem do Teatro que permaneceram até
a atualidade. A renovação em 2024 inicia um processo de repaginação com um
projeto de Reparo e Manutenção do Teatro Carlos Gomes.
Qual o significado de ser o
arquiteto da revitalização do Teatro Carlos Gomes?
O Teatro tem uma representação
muito profunda na cultura da cidade. O interesse pelas artes, especialmente
pela música e pelo teatro, são aspectos importantes da cultura alemã trazida
pelos imigrantes. Era algo comum, nas famílias da época, que todos pudessem
tocar algum instrumento musical ou pudessem cantar. Não à toa, já no início da
colônia, em 1859, temos a criação de um grupo que foi o embrião do futuro
Teatro Carlos Gomes. Essa sociedade posteriormente se reorganizou e criou um
Teatro na rua das Palmeiras, inaugurado em 1896 com a ópera “Uma Ideia Maluca”,
pois alguns consideravam loucura haver um Teatro em uma colônia ainda tão nova.
Em 1935 inicia-se a obra do atual Teatro, à rua 15 de novembro. Com a primeira
etapa das obras concluída em 1939, adota-se também seu nome atual, Teatro
Carlos Gomes. Desde então, o Teatro tem sido palco de importantes eventos, além
de um ambiente de ensino de música, dança e teatro. Exemplar único e muito
especial não apenas em Blumenau, mas em Santa Catarina, destaca-se por sua data
de construção e por seu porte, não havendo outro equipamento similar do mesmo
período em nosso estado. Neste contexto, ser o arquiteto responsável por
renovar e ampliar um equipamento tão importante da história da nossa região é
uma grande honra e uma grande responsabilidade. É a certeza de que vou deixar
um legado para as gerações futuras.
Quais são os elementos
preservados na tua proposta do Teatro Carlos Gomes de 1942?
Toda a arquitetura original do
Teatro está sendo preservada nestas intervenções. Ao longo de sua história o
Teatro Carlos Gomes de Blumenau passou por diversas reformas, intervenções e
alterações de cor que não tiveram o cuidado de olhar para as reais origens
estéticas desta edificação. Foram intervenções que miraram em períodos
históricos errados e diminuíram a força natural do projeto do equipamento. O
estilo Art Déco do Teatro de Blumenau mescla um evidente racionalismo
arquitetônico geral a ornamentações muito econômicas e pontuais: ora com formas
absolutamente geométricas, ora com molduras suavemente arredondadas emprestadas
de estilos mais tradicionais. Com a Europa em guerra durante as décadas de 1930
e 1940, quando nosso Teatro foi construído, temos hoje uma tarefa mais árdua ao
buscar por lá paralelos do mesmo período: sobraram poucos exemplares dentre os
que foram destruídos. Se há poucos exemplos europeus, o mesmo não se pode falar
dos exemplares norte-americanos do mesmo período. Com o advento das guerras,
muitos arquitetos europeus migraram para o novo mundo. E é nas Américas que
vamos encontrar bons exemplos de Teatros em estilo Art Déco. Seus interiores
são sóbrios, densos e com ornamentações douradas. O que eu fiz foi ressaltar,
com a paleta de cor certa e com o destaque das ornamentações, a estética que já
existe no ambiente construído.
A primeira etapa, entregue em
janeiro, do Grande Auditório todo remodelado trouxe insights de uma arquitetura
cênica. Quais são os principais conceitos e repertório que trouxeram inspiração
para esse processo criativo?
Os conceitos contemporâneos de
arquitetura cênica partem sempre de um ambiente de plateia mais escurecido,
para que o foco da luz e da atenção esteja voltado à plateia. Isso não quer
dizer que eventualmente não se possa iluminar a área da plateia para um
espetáculo, mas isso deveria ser feito com canhões de luz específicos, e não
com a iluminação geral. O corpo da edificação da plateia não pode interferir no
espetáculo. Por isso, e também por conta da estética Art Déco, optei por
trabalhar com tons escuros e sóbrios nas paredes.
A proposta tem um conceito
contemporâneo. Qual o desafio de trazer a modernidade preservando a história?
O conceito contemporâneo está no
pensamento, na linha de trabalho. Na verdade eu considero este um trabalho de
“resgate”. Mas se trata de um resgate de algo que não existia, de algo que
nunca foi feito, que é a finalização correta dos ambientes internos do Teatro
de acordo com o universo estético de sua construção. Falaremos da
contemporaneidade em diálogo com a história quando fizermos as futuras
ampliações do equipamento.
Na revitalização do Salão de
Festas e Auditório Heinz Geyer você apostou no escurecimento das paredes. Quais
são as premissas que trazem essa proposta e a importância da iluminação nesse
contexto?
Todo o trabalho no Teatro envolve
um escurecimento das superfícies. Para haver drama, é preciso haver contraste.
Para que uma decoração de um evento fique interessante, é importante que o
fundo não se comunique com as pessoas. A cor escura faz isso, ela serve de
fundo. No entanto, pintar um ambiente de escuro, por si só não resolve os
problemas. Foi necessário um longo estudo, com muitas simulações, sobre como
encontrar as linhas da arquitetura que não haviam sido desenhadas. Veja bem, no
auditório, as molduras existem, os detalhes existem – o que eu fiz foi
ressaltar o que já existia bem definido na arquitetura. Já no Salão de Festas,
os detalhes não existem. É necessário buscar, na fachada do Teatro e na forma
com que o Auditório foi ornamentado em sua época, a lógica para executar a
ornamentação (neste caso, o emolduramento das esquadrias e a unificação de
esquadrias que estão numa mesma linha vertical).